O IIBA (International Institute of Business Analysis) liberou no último dia 31 de março a versão 2.0 do BABoK (Business Analysis Body of Knowledge) para revisão pública. O projeto da nova versão tem uns 6 meses de atraso. E eles descontaram nos revisores: temos só até o próximo dia 15 de maio para apresentarmos nossas sugestões / reclamações. Tática estranha, mas não percamos tempo com ela. Abri este post para fazer uma revisão pública de um único capítulo daquela publicação, o capítulo 4, que trata de uma área de conhecimento (Knowledge Area) chamada “Enterprise Analysis”. Ponto que questiono e critico desde a versão anterior do BABoK.

Antes de descarregar minhas críticas preciso explicar rapidamente a estrutura deste BoK caçula. Ele é formado por 6 KA’s (Knowledge Areas, ou Disciplinas). São elas: i) Planejamento e Monitoramento da Análise de Negócios; ii) Gerenciamento e Comunicação de Requisitos; iii) Análise Corporativa; iv) Elicitação; v) Análise de Requisitos; e vi) Avaliação e Validação da Solução. Cada KA é formada por Tarefas, Técnicas, Entradas e Saídas.

Tarefas são “peças essenciais do trabalho que deve ser executado na análise de negócio”. As técnicas descrevem “como as tarefas devem ser executadas em determinadas circunstâncias”. Momento ‘dã’: tarefas recebem entradas e geram saídas. ufs.. Mas, por favor, não me entendam mal: a estrutura do BABoK é legal, bem simples. Tanto que consegui explicá-la em dois mínimos parágrafos. Vamos então ao que interessa (neste artigo), a “estranha” KA chamada “Análise Corporativa”.

O problema já começa no nome. Tiveram que inventar um substituto para “Análise de Negócio”, porque interpretam este nome como um grande guarda-chuva que incorpora outra macro-disciplina, a Engenharia de Requisitos. Tudo bem, há tempos aprendemos a conviver com nomes e definições confusas. Por falar em definição, “Enterprise Analysis” é apresentada da seguinte forma:

A (disciplina) Análise Corporativa descreve como tratamos uma necessidade de negócio, como refinamos e esclarecemos aquela necessidade, e como definimos o escopo de uma solução viável. Aqui conversaremos sobre a definição e a análise do problema, o desenvolvimento do Business Case, de Estudos de Viabilidade e da definição do escopo da solução.

Na introdução do capítulo 4 do BABoK, que trata especificamente desta disciplina, é apresentada uma definição mais formal e completa:

A Área de Conhecimento Análise Corporativa consiste de uma coleção de tarefas para a análise da situação do negócio para a completa compreensão de seus problemas e oportunidades, além de uma avaliação das condições atuais e futuras com o intuito de identificar as mudanças necessárias para a satisfação das necessidades do negócio e seus objetivos estratégicos. As saídas geradas nesta disciplina fornecem a base necessária para o trabalho de elicitação, análise, validação e documentação de requisitos, e também para a identificação de uma solução para uma determinada iniciativa e / ou para o planejamento de longo prazo.

Escopo da Enterprise AnalysisA definição é legal. Assim como o gráfico ao lado, que ‘explica’ a disciplina em uma apresentação oficial do IIBA. Mas reparem na definição acima e na lista de KA’s do primeiro parágrafo. Se temos lá uma KA chamada “Avaliação e Validação da Solução”, qual a razão da KA “Enterprise Analysis” tratar do desenvolvimento do Business Case e, mais ainda, da elaboração de estudos de viabilidade? Confunde, não?

Claro, uma avaliação mais profunda das técnicas mostra que estamos falando de coisas diferentes. Para ser mais exato, de momentos diferentes! Então, como fruto de um trabalho notadamente departamentalizado, temos que o estudo de viabilidade não está no escopo da disciplina Avaliação e Validação da Solução. Tudo bem. Como eu já disse, estamos acostumados a conviver com definições confusas e dúbias.

Em meu entedimento, o problema com a disciplina Análise Corporativa é outro, consideravelmente maior. Ela deveria incorporar aquilo que conhecemos como Análise e Modelagem de Negócios. Não é o que acontece. Veja abaixo a lista de tarefas que formam esta KA:

  1. Definir as necessidades do negócio;
  2. Determinar o gap entre as necessidades e a capacidade do negócio de atendê-las;
  3. Determinar o enfoque recomendado para a solução;
  4. Definir o escopo da solução; e
  5. Desenvolver o Business Case.

Que estranho: em nenhum momento o Corpo de Conhecimentos da Análise de Negócios fala sobre “aprender o negócio”, “entender o negócio”. Já cai direto na “definição das necessidades do negócio”. Tamanha pressa é medo dos agilistas (muito citados no BoK)? Sigamos, agora sem ironias.

Alguém pode dizer que está implícito na compreensão das necessidades de um negócio o aprendizado sobre o próprio negócio. Grave engano, e as estatísticas sobre projetos que falham são a maior prova que posso apresentar. Só consigo aprender realmente as necessidades (requisitos) de um negócio depois de conhecê-lo. Façamos uma breve (e covarde) analogia: você saberia dizer as necessidades de sua (seu) namorada(o) ou esposa(o) antes de conhecê-la(o)? Antes mesmo de manifestar suas intenções?

Se eu não conheço um negócio, aquele domínio, como posso avaliar suas necessidades e oportunidades? Pior, como posso “definir o escopo de uma solução”? Vale aqui ressaltar que conhecer um negócio não se limita ao entendimento daquela entidade, mas compreender todo o seu ambiente, clientes, concorrentes, parceiros, legislação e um monte de etc.

Por essas e (muitas) outras insisto que o BABoK pode criar uma terrível distorção do trabalho conhecido como Análise de Negócios. Como tempo e espaço ficaram curtos, deixarei para o próximo artigo a porção mais construtiva de minhas críticas.

Mas, claro (!), sobrou um tempinho para convidá-lo a conhecer uma visão um pouco diferente da Análise de Negócios. Acontece no próximo dia 24/abr, em Sampa, a 2ª edição da oficina “Análise e Modelagem de Negócios”. Nela e em sua co-irmã, Engenharia de Requisitos, apresento as tarefas e técnicas que são utilizadas por um Analista de Negócios. Claro, contemplo todas as boas idéias sugeridas no BABoK. Mas, definitivamente, não o considero um “corpo fechado”. Por isso apresento vários adendos, inclusive o uso da UML para a modelagem de negócios.

Merchan Parte II: quem participa dos eventos ganha uma versão digital de meu (adiado) livro (com garantia de atualização até a versão 1.0), alguns PPT’s e, o mais importante, acesso ao Grupo de Discussão AN.br. Já somos mais de 200. E no último mês batemos o recorde de mensagens trocadas. Está muito quente e rico. E a última iniciativa do grupo é o estudo conjunto do BABoK. No meio de nosso “toró de parpites”, já pintou até a sugestão de elaboração de um “BABoK Apócrifo”. Pode? Claro que pode! Inté!