Não. Não conheço nenhum analista de negócios perfeito. E estou certo de que nunca verei um. Perfeição é uma meta impossível. Por isso estranhei a falta de questionamentos aos textos “Um Corpo de Verdade” (da Análise de Negócios) e “Coração e Mente do Analista de Negócios“. Os dois artigos sugerem a existência de um analista de negócios (AN) perfeito. Ninguém reclamou. Ninguém achou que eu estava ‘pedindo demais’. Será que acreditaram na possibilidade de um AN com pernas longas e torneadas, braços fortes e hábeis, coração aberto e mente aguçada? Este artigo trata da impossibilidade da perfeição e sobre como organizações e profissionais podem lidar com ela.

A pergunta que recebo com mais frequência é: “por onde começo?” Costumo apontar para o Corpo (de Conhecimentos de Verdade) e dizer: escolha. Ninguém começa do zero. Boa parte dos participantes de meus cursos tem formação relacionada a TI. Espero que eles comecem pelo que não conhecem, o negócio. Mas não forço a barra. Sempre digo que devem iniciar seus estudos escolhendo um de dois caminhos possíveis: o que mais incomodou OU aquele que mais agradou. Cada pessoa tem estilo e ritmo de aprendizado únicos. Devem saber se é o desafio (de uma área nova) ou o conforto (de um terreno conhecido) o que mais as motivará.

No Corpo sugerido, a base das duas pernas (lembrando: direita = Negócio, esquerda = TI) é formada por disciplinas fundamentais, aplicáveis em negócios ou projetos de qualquer porte ou natureza. É conhecimento que se leva para o resto da vida. O AN, mesmo iniciante, deve saber inventariar seus conhecimentos em ambas as áreas. E orientar seus estudos no sentido de equiparar as pernas. O AN é ponte entre as áreas de negócios e TI. Espera-se que ele tenha razoável domínio de ambos os lados. Só assim se comunicará de igual para igual com todos. É difícil apontar cursos ou um conjunto de livros que formem esta base para um AN. Talvez minha lista de “11 Livros ‘Obrigatórios’” ajude um pouco. Mas o AN deve saber que só o tempo (e muitos projetos e estudos) ajudará a desenvolver esta base de conhecimentos.

A parte de cima das pernas representa conhecimento mais ‘perecível’ e / ou especializado. É o tipo de conhecimento que pode ser adquirido e ter utilidade em apenas um projeto ou em projetos específicos de determinado segmento. Não sei dizer se aqui no Brasil, a exemplo do que vejo lá fora, as empresas começarão a exigir dos AN’s a especialização em determinado ramo de atividades. Mas acho que os AN’s deveriam se preocupar em mostrar um pouco de especialização em seus currículos.

As habilidades de um AN, representadas pelos dois braços, são desenvolvidas mais rapidamente. Qualquer cursinho de poucas horas que não privilegie o fortalecimento de um braço em detrimento do outro está valendo. Lembrando: o braço direito representa habilidades que o AN desenvolve para entender um Negócio; o canhoto reúne habilidades que o AN precisa para entender os Usuários. Novamente o equilíbrio e a simetria são fundamentais. Assim como é fundamental aceitar que habilidades apenas são aperfeiçoadas com muita prática. Cada braço (ou disciplina) compreende um sem número de métodos, práticas e ferramentas. O bom AN deve desenvolver e manter atualizado seu “cinto de utilidades”. Ele sabe que cada negócio, projeto ou usuário pode exigir uma combinação única de ‘brinquedinhos’ que facilitem a comunicação e o aprendizado.

O bom AN tentará manter seu corpo simétrico. Buscará a perfeição, apesar de aceitar sua impossibilidade. E as empresas? Como elas podem lidar com a imperfeição de seus analistas?

Em primeiro lugar, conhecendo-os. É crucial que a organização saiba quais são os pontos fortes e fracos de cada membro de sua equipe. Se o que foi apresentado acima foi minimamente entendido, então a empresa sabe que não realizará seu ‘inventário de conhecimentos & habilidades’ aplicando provinhas ou exigindo certificados e diplomas. Desconheço certificação ou diploma que garanta que um AN saiba falar, conversar e entender um usuário ou negócio. O buraco é mais embaixo… fica perto da camada do pré-sal.

Não pretendo tratar aqui do processo de seleção de AN’s. Talvez em um futuro artigo. Só queria salientar que uma organização deve desenvolver uma forma de avaliar conhecimentos e habilidades de todo o seu time de Análise de Negócios. Ela deve saber quais tipos de conhecimentos básicos (administração, informática, contabilidade, finanças etc) deve cobrar e ajudar a desenvolver. Em um banco, por exemplo, uma parte do time de AN’s é formada em Direito. Sim, são advogados preparados para os jargões e trejeitos de uma área jurídica. Considerando exclusivamente as pernas (conhecimentos do Negócio e de TI) tenho apenas uma recomendação: que o time de AN’s não seja composto exclusivamente por profissionais com formação em TI. A diversidade é mais que necessária. Aquele mesmo banco tem uma coordenadora formada em Letras. Em uma empresa de telecomunicações vi um AN publicitário. Se é para ser mais objetivo, cravo um número: que metade do time NÃO tenha formação em TI¹.

As habilidades (para entendimento do Negócio e dos Usuários) devem ser avaliadas e desenvolvidas em conjunto. Não faz nenhum sentido que um AN só entenda o negócio enquanto outro apenas entende o usuário. As habilidades se completam. E são sempre aprendidas, desenvolvidas e aplicadas simultaneamente. Mas todos sabemos que as pessoas aprendem de maneiras e ritmos diferentes. Assim como sabemos que as habilidades sociais podem ser bastante distintas de um analista para outro. Não devemos condenar (ou deixar de contratar) um AN que se mostre um tanto tímido e introvertido. Não se ele compensar essa aparente deficiência com boa cabeça para solução de problemas e/ou excelente comunicação escrita e/ou destreza em atividades de modelagem etc.

Metade da equipe formada em TI, metade não. Metade atualizada em relação ao negócio, a outra em relação à TI. Metade rica em habilidades sociais, outra metade tecnicamente habilidosa. Este é o retrato de um bom time de Análise de Negócios. De um time que, por se completar, exibe um Corpo mais simétrico e, por que não dizer, perfeito. Daí à conclusão de que esses profissionais sempre trabalham em duplas é um pulinho, certo²?

Observações:

  1. Pelo andar da carruagem, talvez esteja próximo o dia em que vamos pedir que metade de um time de AN’s tenha formação em TI. Digo isso porque todo dia aparece alguém dizendo que vão faltar 200 mil ou 800 mil profissionais na área.
  2. Não se preocupe se a sugestão para o trabalho em duplas não pareceu tão óbvia para ti. O próximo artigo falará exclusivamente sobre isso.
  3. O Woody todo vaidoso acima, fotografando a si mesmo, é obra liberada por Sherman Tan no Flickr.