Apesar dos 60+ anos de estrada, o Pensamento Sistêmico ainda está muito distante da popularidade. Não é fácil se livrar da mentalidade e dos vícios acumulados em mais de cinco séculos. Depois de alguns voos de galinha¹, a área ganha novo impulso. Será que temos, pela primeira vez, uma linguagem realmente universal? O DSRP cumprirá sua promessa de tornar o Pensamento Sistêmico acessível para todo mundo? Literalmente? Vejamos.

Antes, porém…

Preciso cobrir um buraco que deixei, por querer, naquele pequeno glossário dos sistemas complexos. Saca só: a complexidade emerge da interação entre agentes autônomos que são guiados por regras simples. Complexo? Exemplos devem ajudar.

Insisto que você é um sistema complexo. Lá no fundo (!) você é resultado da combinação de apenas 4 moléculas orgânicas – ATCG – que formam o seu DNA. Sem ofensas. A Luana Piovani também é. Mas apelemos para outras ilustrações.

O jogo de xadrez tem apenas 6 tipos de peças. Elas têm regras simples de movimentação. Cada jogador conta com 16 delas. Mas só os primeiros dez movimentos têm 1,7 x 1029 possibilidades.

Com apenas 4 cores (ciano, magenta, amarelo e preto – CMYK) podemos gerar todas as outras. Partindo de 7 notas musicais Hendrix, Page, Lennon, McCartney, Chico e Beethoven compuseram maravilhas mil.

Enfim, lá no fundo da “alma” de qualquer sistema complexo há um conjunto de agentes interagindo segundo regras simples. Essa é a base da proposta de Derek Cabrera, criador do DSRP. Ou seja, existem regras simples orientando o Pensamento Sistêmico.

Pensamento Sistêmico = {Quatro Regras Simples}

Um dia elas foram expressas assim:

Mas ficam mais acessíveis quando colocadas da seguinte maneira:

Distinção: qualquer coisa ou ideia pode ser distinta de outras coisas ou ideias.
Sistema: qualquer coisa ou ideia pode ser o todo ou uma parte de outra coisa ou ideia.
Relacionamento: qualquer coisa ou ideia pode se relacionar com outra coisa ou ideia.
Perspectiva: qualquer coisa ou ideia pode ser o ponto de vista ou aquilo que é visto.

Tudo o que é estudado foi delimitado antes. Traçamos fronteiras e determinamos o que está dentro e o que está fora; Definimos o que aquilo é e, consequentemente, o que aquilo não é. Nesse mundo de polos cada vez mais distantes (e pouco sistêmicos), o que é petralha não pode ser coxinha e vice-versa. Apesar do mal uso, distinções são inevitáveis.

Tudo pode ser quebrado em partes. Em todos os sistemas há uma hierarquia (apesar de algumas modas insistirem na possibilidade de eliminá-la). E tudo, qualquer sistema, é parte de um sistema maior. Não vou falar sobre seu esôfago de novo.

Para toda ação há uma reação. Existem diversos tipos de relacionamentos (causal, fidbeque, influência, correlação etc) e em todos há ação e reação. Eles existem dentro e entre qualquer sistema (coisa ou ideia).

Qualquer coisa ou ideia pode ser vista a partir de diversas perspectivas. Aliás, ela (coisa ou ideia) pode ser também uma perspectiva, um ponto de vista. Para alguns autores da velha guarda, como Churchman², o Pensamento Sistêmico “começa quando você enxerga o mundo pelos olhos de outra pessoa”.

Sim, podemos começar pelo P(onto de vista). Ou pelo D, S ou R. A ordem não importa. Mas o Pensamento Sistêmico só ocorre em sua plenitude quando as quatro regras são aplicadas.

Parece uma Coisa à Toa

A velha guarda enfatizava os sistemas. Cabrera propõe que o Pensamento tenha a mesma importância. Os avanços recentes da neurociência e das ciências cognitivas nos permitem melhor entendimento sobre o funcionamento de nossas cucas. Possibilitam até que discordemos de Churchman: o Pensamento Sistêmico começa quando refletimos sobre e revemos nossa maneira de pensar – quando hackeamos nosso cérebro. A gente voa quando começa a pensar³ (sobre o nosso pensar).

Um artigo de 600+ palavras não pode ter a ambição de mostrar todo o potencial do DSRP e sua ferramenta de modelagem, o MetaMap. Na OPS! (Oficina de Pensamento Sistêmico) você mergulha e voa com eles. Inté!

Notas

  1. O mais notável voo de galinha aconteceu no início dos anos 1990, com a publicação do livro A Quinta Disciplina, de Peter Senge (Best Seller, 1992). Foram vendidas mais de um milhão de cópias no mundo todo. Senge, meio sem querer, nos levou a crer que o Pensamento Sistêmico se limitava à uma visão bem particular da Dinâmica de Sistemas. Posteriormente, ele pediu desculpas por ter abusado do termo (Systems Thinkers, pág. 121 – Springer, 2009). Pelo bem ou pelo mal, devemos a ele o voo mais promissor da disciplina até hoje.
  2. Citado no mesmo livro, Systems Thinkers.
  3. Trecho surrupiado de “Felicidade”, que não é de Caetano, Tom ou Vinícius (como aparece em diversos sites de letras e cifras). Quem disse que a gente “voa quando começa a pensar” foi o gaúcho Lupicínio Rodrigues.
  4. Citação tupiniquim, foto idem. Quatro é de autoria de Fernando Prado.