Está na moda pensar. Veja quantos papos sobre thinking pintaram nos últimos tempos. Listas de livros mais vendidos têm presença garantida de algum último achado das neurociências. Parece que estamos numa trilha de iluminação. Só que não. E não é preciso muita atenção para perceber como as coisas parecem ir de mal a pior. Culpa dos pensamentos? Ou da falta deles?

Enxurrada de Pensamentos

Agile, Complexity, Creative, Critical, Design, Game, Lean, Liminal, Magical, Product, Service, Smart, Systems, Strategic, Visual, Zen. Tudo isso e mais alguns termos que devo ter perdido no caminho já mereceu o sobrenome Thinking. Todos apelam para que utilizemos uma das únicas coisas que podem nos diferenciar das máquinas: a capacidade de pensar.

Sim, porque é um engano clássico imaginar máquinas pensantes. Um mal entendido conhecido como a Falácia da Inteligência Artificial. Máquinas não reproduzirão nosso jeito de raciocinar. O que não as impede de realizar um monte de coisas que são impossíveis para nossos cérebros. Retomando o papo do artigo anterior, sobre O Futuro das Profissões, é hora de uma dica não oferecida lá: devemos apostar no que nos torna únicos, especialmente na capacidade de pensar. Onde, quando e como aprendemos a pensar?

O Desserviço das Escolas

Seria impossível listar todos os trabalhos que berram por uma revolução total na forma como educamos crianças, adolescentes e adultos. Nada a ver com a ingênua proposta de uma “escola sem partidos” nem com questões quantitativas. Por desserviço entenda o seguinte: as escolas reprimem tudo o que é valioso hoje e será ainda mais no futuro.

Surrupiei textos de Drucker, Ackoff e Semler para destacar os principais problemas. Hoje eu também citaria Sir Ken Robinson e Salman Khan¹. Mas vou direto ao ponto, com minhas próprias palavras: escolas não sabem ensinar a pensar².

Impulsivo e Preguiçoso

Pense nos doze meses do ano. Agora, coloque-os em ordem alfabética. Esse teste bobinho mostra bem o funcionamento dos dois sistemas que operam em nossas cabeças, o Rápido (1) e o preguiçoso Devagar (2). Daniel Kahneman nos conta como, ao contrário do que gostaríamos de acreditar, o sistema 1 prevalece em decisões do dia a dia³. Somos bem mais impulsivos do que racionais. Quais são os nossos desafios?

O sistema 1 é resultado de milênios de evolução. Apesar dos erros causados pela sua “pressa”, ele nos trouxe até aqui. Como o mundo anda bem mais complexo, é natural que ele esteja um tanto atordoado. E mais desastrado.

O sistema 2 é mesmo preguiçoso. Se a gente deixar, ele não trabalha. O teste acima deve ter te mostrado isso. Você colocou os doze meses em ordem alfabética? Sério?

Nosso grande desafio está em motivar o sistema 2 e dar uma segurada na impulsividade do sistema 1. O cérebro é um só e é claro que em cada pessoa o setup é um tanto diferente. Por isso temos os mais centrados, os inconsequentes, os introspectivos, os sistemáticos e os tô-nem-aí, dentre outros.

Mas o desafio é para todos. Nosso cérebro é o sistema mais complexo conhecido. É, de fato, a primeira maravilha da natureza. Quem aprender a utilizá-lo de forma mais eficaz aumentará as chances de sucesso.

Usando a Cabeça

Todos os thinking listados acima têm seu valor e aplicação. Alguns são rasos. Outros, bastante específicos. Há também quem fale não sobre pensamentos, mas sobre o desenvolvimento de um Sétimo Sentido4. Que bom que temos tantas opções. Só os fundamentalistas não curtem muito isso. Mas há um preço alto por ter tantas alternativas: usar a cabeça e fazer escolhas.

Minha opção pelo Pensamento Sistêmico não vem de hoje. Prepare-se para rir: foi receita de um médico veterinário, aviada há exatos 20 anos. Nem sei dizer como sou grato ao “doutor” Ricardo Marques5.

De Capra para Senge, Meadows, Weinberg, Russell, Checkland, Ulrich, Churchman, Ackoff, Beer, Espejo, Ashby, Mead, Boulding, Vickers, Lewin, Maturana, Jackson e, mais recentemente, Cabrera, foi um fluxo (não um pulinho). Como colocou Newton, como é legal a vista quando se está sentado em ombros de gigantes.

O Pensamento Sistêmico ainda tem muitos sentidos para muita gente. Jurgen Appelo, em Management 3.0, e artigos recentes6 lhe descem o malho. Isso é bom – fidbeques negativos sempre serão necessários se o que se busca é evolução e viabilidade.

E o Pensamento Sistêmico, depois de um pequeno hiato, se renova nas propostas de Derek Cabrera e em ferramentas bem modernas. Busca viabilidade ao fixar um propósito bem nítido: alinhar nosso modo de pensar com a forma como o mundo realmente funciona. Não é pouca coisa. E parece ser uma boa aposta.

Notas

  1. De Ken Robinson, duas sugestões: Libertando o Poder Criativo (HSM, 2012) e esta palestra no TED.
    De Salman Khan, fundador da Khan Academy, Um Mundo, Uma Escola (Intrínseca, 2013)
  2. Toda generalização é estúpida, eu sei. Mas a afirmação só deve machucar de verdade um conjunto muito pequeno de exceções que confirmam a regra. A elas, minhas sinceras desculpas. E um pedido para conhecê-las de perto.
    Outra coisa: não é culpa de diretores, professores, ministros. A culpa é de todas as partes interessadas que parecem não se interessar muito pelo tema, particularmente pais e alunos.
  3. Rápido e Devagar: Duas formas de pensar (Objetiva, 2012).
  4. The Seventh Sense: Power, Fortune, and Survival in the Age of Networks
    Joshua Cooper Ramo (Little Brown and Company, 2016)
    Se quisesse, o autor poderia sugerir um Network Thinking ao invés de um sétimo sentido. Talvez ele tenha percebido certo cansaço do termo “thinking” 🙂
  5. Fomos colegas na Coopersum, a primeira empresa a rodar um PowerPC em Minas. Há tempos procuro por esse cara. Nem o Google me ajudou. Ele é do terceiro B do triângulo mineiro, a b… de Araguari, e viveu por muito tempo em Elói Mendes (Mutuca para os íntimos). Sei que parece impossível, mas se alguém tiver alguma pista… Devo muito a ele.
  6. Naquele artigo, o mal entendido aparece logo no subtítulo: “uma organização não é um sistema”. A autora Bonnitta mira na cibernética (ecoando críticas rebatidas há tempos) e desconsidera as contribuições de diversas linhas do Pensamento Sistêmico, como Soft Systems Methodology (SSM), Human Systems Dynamics (HSD), Adaptive Action e o novo DSRP, principalmente. Não importa. Falem mal, mas conversem sobre o Pensamento Sistêmico. É preciso.
  7. brains é a foto de hoje. Surrupiada de Oferico no flickr.