O artigo anterior mostrou como o tempo pode determinar a estrutura de uma organização. Operação cuida do presente, Propósito vislumbra o futuro e Transição é o caminho entre as duas. Como colocado, tal classificação raramente é formalizada. São outros os critérios que normalmente caraterizam o desenho de um negócio. Este artigo os apresenta e comenta.

Antes, porém, uma questão meio boba: por que estruturar? Uma empresa divide o trabalho para ganhar produtividade e escala. Imagine um sujeito fabricando um carro sozinho. Baita trampo, não? E se não fosse só a fabricação? E se ele tivesse que cuidar da propaganda, da venda do carro, da contabilidade, dos livros fiscais… Paro por aqui, você já entendeu.

São três os critérios utilizados na hora de dividir o trabalho. O primeiro é a função. Temos unidades organizacionais (áreas, departamentos, seções) que cuidam de funções específicas. Por exemplo: contabilidade, RH, produção, marketing etc. Entre elas há uma divisão importante. Algumas se dedicam a serviços internos (dois primeiros exemplos) enquanto outras estão diretamente ligadas ao núcleo do negócio (core business), cuidando de alguns processos primários (produção e marketing). Por falta de um termo melhor vamos chamá-las de Unidades de Entrada.

O segundo critério que pode orientar as divisões internas são os produtos e serviços comercializados. Dessa forma podemos ter uma unidade organizacional cuidando exclusivamente de um produto/serviço ou de uma linha de produtos/serviços. Daí aquela unidade que só vende seguros; a seção de livros de TI na chique livraria; a moça que só sabe falar de pós-pago etc. Essas são as Unidades de Saída.

Por fim, temos o cliente ou mercado podendo determinar parte da estrutura de uma organização. Por isso existe a subsidiária para a América Latina, a filial que cuida da região Sul ou a loja do bairro tal. Também é bastante comum a divisão entre quem atende pessoas físicas e contas corporativas. Clientes VIP endinheirados merecem unidades personnalité, bem diferentes do tradicional varejão. Trataremos essas como Unidades de Relacionamentos.

Os três critérios não são mutuamente exclusivos. Em diversas empresas convivem combinações dos três. Convivem? Bem, vamos dizer que tentam. Quando se fala em reestruturação, o que vemos são mudanças do poder de cada um deles. Além, claro, de um tradicional banho de sangue. Melhor explicar.

Geralmente as organizações são concebidas de cima para baixo. O que aparece logo depois do patrão/presidente/CEO é resultado da aplicação do critério que venceu a primeira queda de braço. Qual deles determinou a divisão das vice-presidências e diretorias? Têm mais poder as unidades de saída (produtos e serviços) ou de relacionamentos? Mesmo em organizações que demonstram certa variação na composição do alto escalão é fácil perceber quem são os queridinhos de fato influentes.

Organizações matriciais foram propostas para colocar certa ordem na bagunça¹. De forma bem resumida podemos dizer que elas representam o cruzamento de dois critérios. Unidades de Saída X Unidades de Entrada ou Unidades de Relacionamento X Unidades de Saída, por exemplo. Você percebeu, um critério sempre fica fora da brincadeira. Quem dera fosse esse o maior problema. Na proposta original das organizações matriciais uma pessoa tem dois superiores, cada um representando um critério. Nem vou apelar para o ditado sobre o cachorro com dois donos… Muito pior é se imaginar com dois chefes!

O cada vez mais necessário Drucker² um dia chamou nossa atenção para o fato de a competitividade dentro das organizações ser cada vez mais intensa e menos ética do que com a concorrência externa. Os desenhos tradicionais, todos derivados da estrutura hierárquica, têm muito a ver com essas guerras intermináveis. Toda causa que você conseguir imaginar é facilmente rastreável até a mensagem tácita do modelo hierárquico: olha o pódio – só pode haver um vencedor! Chuck Norris adora isso…

Sabia que o Chuck um dia apareceria por aqui. Mas cadê o Ripongo do título? Bom, ele tá louco (!%?) pra dar uns palpites mas ficou com medo do Chuck. Fica pra próxima semana. Inté!

Notas

  1. A ideia das Organizações Matriciais é antiga e repleta de pais, padrinhos e fervorosos defensores. Por isso posso dispensá-los das referências. Caso necessário, Google!
  2. Peter F. Drucker, citado em Re-Creating the Corporation de Russell Ackoff (Oxford University Press, 1999).
  3. Aliás, acho que posso dizer que o texto acima é a primeira parte de um relaxado resumo de um capítulo do livro do Ackoff. Hã?
  4. A assustadora imagem utilizada – Habitats – é de Benjamin neBen Le Gentil.