Um erro detectado enquanto um requisito é só isso, um requisito, custa $1. O mesmo engano, em fases avançadas de um projeto, pode custar $100, $1.000 ou até mais. O capítulo de hoje da série +Requisitos +Conversas é sobre a qualidade dos requisitos. Quais são as características de um bom requisito?

Quem explora e desenvolve requisitos deve se preocupar com sete questões fundamentais. São testes executados várias vezes e em diversos momentos de um projeto. Segue a lista¹:

É Necessário?

O requisito realmente dá alguma contribuição, ainda que pequena, para a realização dos objetivos do negócio? Apesar de nossa insistência em perguntar a clientes e usuários pelo valor de cada requisito, a revalidação se paga. Porque podem aparecer funções, atributos ou restrições que, depois de certo tempo, perdem o sentido.

Também não pode existir, em nenhum tipo de projeto, um requisito que não se relacione com nenhum outro. Tratamos aqui de relações de dependência ou complementaridade, como visto anteriormente. Não há uma conta “diversos” em  projetos minimamente sérios.

É Compreensível?

No frigir dos ovos, um requisito é só “uma condição necessária para alcançar certo fim” (Houaiss). Nada justifica que seu entendimento seja difícil. Requisito é informação. E informação é “dado investido de relevância e propósito” (Peter Drucker). Informação é “a diferença que faz diferença” (Gregory Bateson)Por isso enriquecemos cada requisito com um conjunto de características que o explica e justifica: fonte, perspectiva, valor, relações e estado, pelo menos. Cada característica aumenta nossa compreensão sobre o requisito. Claro que, antes de qualquer coisa, a redação do requisito deve ser clara e objetiva. A estruturação não nos isenta da boa escrita.

Está Completo?

Um requisito que apresente pendências não deveria avançar em seu ciclo de vida. O solicitante aguarda alguma informação ou ainda precisa confirmar algo com alguém? Devemos oferecer nosso apoio, resolver as pendências e só então incorporar o requisito.

A recomendação é outra quando a pendência é fruto da insegurança de quem manifestou o requisito. Se é algo de muito valor, então acelere ou antecipe a realização daquele requisito. Coloque-o no topo da fila e faça com que entregas preliminares tranquilizem o cliente ou usuário. Mais sobre isso no último item da lista.

É Verificável?

Se não há a menor ideia sobre como a realização do requisito será testada, é provável que não seja um requisito. Atributos pra lá de ambíguos (tela bonita, processo rápido, operação fácil etc) também comprometem a testabilidade de uma solução. Eles devem ser evitados a todo custo. Todo bom requisito sugere, de maneira clara, pelo menos um teste que comprova sua realização.

É Viável?

O valor atribuído a cada requisito ou grupo de requisitos possibilita seu posicionamento vertical (eixo benefício) na matriz ao lado. Estimativas de custo de cada alternativa de solução² indicam a posição horizontal. Temos assim uma ferramenta que apoia a análise benefício/custo³ de todo o escopo de um projeto.

Pesadelos são descartados sem dramas. Dado o baixo valor agregado de determinado requisito, sua realização só faz sentido quando for uma bobeirinha – algo fácil e barato de construir. É a metade superior da matriz que merece nossa atenção. Se todas as alternativas fossem sonhos, com certeza você não estaria aqui. Projetos dignos de nota sempre oferecem algum tipo de desafio – módulos de muito valor cuja realização envolve alguma complexidade técnica e, consequentemente, alto custo.

Utilizamos valores relativos, tanto para benefícios quanto para custos, quando os números reais ainda estão distantes. Podemos utilizar escalas simples (Fundamental=3, Importante=2, Opcional=1) ou um pouco mais sofisticadas (a sequência de Fibonacci, por exemplo). Esta validação nos ajuda a definir o escopo ideal de uma solução. De quebra, ela sugere prioridades.

Está Priorizado?

A melhor imagem do escopo de qualquer projeto é uma fila indiana. Cada requisito incorporado merece uma posição única. No topo, temos tudo o que é fundamental para a realização dos objetivos do negócio. No fim, tudo o que pode ser cortado sem choro nem vela.

Quando é possível colocar em produção as entregas parciais, então os sonhos serão prioritários. Desta forma antecipamos a realização de valor. Caso contrário – quando tudo deve ser entregue em conjunto – começamos pelos desafios. Depois de entregar o que realmente importa, em havendo tempo e dinheiro, desenvolvemos algumas bobeirinhas.

Está Correto?

Enfim, resta saber se o requisito está correto. E o que garante sua correção? A assinatura do cliente ou usuário no documento de requisitos? Um contrato redigido pelo mais competente escritório de advocacia? Nada disso pode garantir que um requisito esteja correto. Só conseguimos 100% de certeza quando o requisito não é mais “uma condição para alcançar determinado fim”. Só temos total certeza de sua correção quando o fim é alcançado. Isso só é possível com a solução entregue e em funcionamento. O que pode demorar dias, semanas ou até meses para se confirmar.

Tamanha distância não nos livra da busca pela correção dos requisitos. Qualquer coisa – modelos, protótipos, versões alpha e beta e paliativos afins – que minimize o frio na barriga das partes interessadas pode e deve ser utilizada. Desde que haja consciência de que apenas o produto final, devidamente entregue e em funcionamento, terá as respostas definitivas.

 

Notas

  1. A lista acima não tem nada a ver com os famigerados checklists que divertem ou enganam leitores de algumas revistas populares. Porque não é simples como: sim, não, sim, sim, não, não, sim = 17 pontos: tô gordo! Não é possível aplicá-la em um ponto específico do projeto. São validações e testes que analistas e demais envolvidos executam diariamente. Obsessivamente.
  2. É de quem vai construir a solução a responsabilidade por apresentar alternativas e respectivas estimativas. Para que esta ferramenta funcione direitinho, a turma de negócio fala sobre benefícios e o time técnico sobre custos. O embate, a tensão criativa, tende a fazer emergir a melhor solução possível.
  3. Não estou inventando moda. Foram Tom DeMarco e Timothy Lister, em Peopleware (Dorset House, 1999), que sugeriram a análise benefício / custo. A grafia “análise custo X benefício” carrega dois equívocos: i) a suposta operação ( multiplicação ou subtração) não faz nenhum sentido matemático; ii) a colocação do custo antes do benefício é coisa de gente mesquinha.
  4. Este artigo é uma releitura das sugestões apresentadas por Karl Wiegers em Software Requirements (Microsoft Press, 1999).