Tratar este trabalho como um almanaque é uma forma esperta de me isentar de certas responsabilidades. Pare por um instante e pense em como você receberia um Manual ou Guia para tempos difíceis. O que dizer das enciclopédias e bíblias? Um almanaque promete menos, muito menos.
Um bom almanaque é obrigatoriamente informal, prático e objetivo. Devo adiantar que sigo Kurt Lewin¹, para quem “não há nada mais prático do que uma boa teoria”. Este almanaque está cheio delas, das teorias. Se são boas ou não você dirá. É essa base teórica que justifica e viabiliza a organização deste trabalho. A mesma base vai te ajudar a desenvolver uma caixa de ferramentas para esses tempos difíceis.
Todos os bons almanaques têm outra característica inevitável: são obrigatoriamente amplos e responsavelmente rasos. 2 km de extensão por 2 cm de profundidade. Neste almanaque não faltarão dicas e referências para todos que quiserem ir além dos 2 centímetros. Os almanaques tradicionais têm periodicidade anual. Este não tem prazo de validade.
Tudo muito bom, tudo muito bem. Mas, afinal, do que é feito este almanaque? Quais assuntos ele trata? Para quem? Por quê?
Quatro Volumes
O almanaque.digital está organizado em quatro volumes:
- O TODO: concentra as teorias e ferramentas fundamentais, aplicáveis em todos os demais níveis. É o alicerce ou framework teórico que dá sentido e utilidade para as demais sugestões apresentadas.
- A ORGANIZAÇÃO: qualquer organização, seja ela pública ou privada, minúscula ou imensa. Neste volume tratamos da empresa e sua co-evolução com o ambiente que a cerca.
- OS TIMES: são as células que dão forma e sentido para uma organização. Há boa ciência por trás dos times de verdade e seus diversos relacionamentos.
- A GENTE: porque sem a gente nada disso faria sentido.
A sequência tem uma lógica, é fractal. O modelo que prova a viabilidade de uma organização é o mesmo que atesta a nossa viabilidade e de nossos times. Ele é recursivo.
Por isso esse trabalho não será desenvolvido de maneira linear. Os quatro volumes vão evoluir em paralelo. Se for fácil escrever assim, será fácil ler assim. Assim espero.
E você, o que pode esperar? Este almanaque te convida para alguns desafios.
Três Desafios
Se há alguma chance para nós humanos, ela passa obrigatoriamente pelo bom uso do que nos torna… humanos. O que nos diferencia dos outros seres vivos?
Biologicamente, é esse intrincado sistema nervoso central chefiado por uma feia e enrugada massa cinzenta. Esse aparato formado por bilhões de células e capaz de trilhões de relações não tem paralelo conhecido no universo. Ele nos dá três habilidades muito especiais.
A primeira é a capacidade de pensar sobre nossos pensamentos, de avaliar nossas ações e rir de nós mesmos. Se somos capazes da autocrítica, humildes e honestos, então estamos liberados para criticar todo o resto. O Pensamento Crítico é nada menos que fundamental em tempos de infobesidade². Sem ele não temos condições de compreender nem de priorizar nada. Sem ele não podemos tirar sarro de ninguém. Este é o primeiro desafio proposto neste almanaque: incentivar o pensamento crítico.
Nossa segunda capacidade exclusiva é o ato de sonhar acordado, viajar na maionese e imaginar. Veremos neste almanaque que a imaginação é requisito para a criatividade que é condição para a inovação³. Como colocou Einstein, “criatividade é a inteligência se divertindo”. Pode haver algo mais humano? Segundo desafio: estimular o Pensamento Criativo.
Não há desperdício maior do que ser capacitado para trilhões de sinapses e se conformar com alguns dogmas ou certezas. Não é possível que todo esse poder computacional que carregamos em nossas cabeças não seja capaz de lidar com a complexidade e perceber o mundo da forma como ele realmente funciona. Terceiro desafio: provar que somos capazes do Pensamento Sistêmico4.
Três desafios: Crítico, Criativo e Sistêmico. Para quem?
Dois Leitores
O primeiro é você, que chegou até aqui. Sinceramente, muito obrigado!
Porque todas as vezes em que apresentei a ideia deste almanaque ouvi a mesma pergunta: quem é o público alvo? Caraca! Primeiro: detesto esse papo de alvo. Segundo: não sei! Não sei mesmo. Este almanaque não pretende ser um livro de negócios e muito menos um manual de auto-ajuda. É o mau de ser antidisciplinar e indisciplinado: você fica sem rótulo e, consequentemente, sem prateleira nem público-alvo. Isso te incomoda? A mim, não.
E eu, como aprendi com William Zinsser5, sou o segundo leitor. Só estou desenvolvendo este trabalho porque não encontrei nada parecido em lugar nenhum. Ou seja, é algo que eu gostaria muito de ler. Isso será suficiente para te satisfazer? Não sei. Mas espero, sinceramente, que você me diga.
O que nos traz ao último ponto: por quê?
Cinco Porquês
Por que este almanaque?
Porque a gente precisa aprender a usar melhor a cabeça.
Por quê?
Porque talvez essa seja a única maneira de sobreviver e prosperar.
Por quê?
Porque o mundo está ficando a cada dia mais complexo e complicado.
Por quê?
Porque a gente não está usando bem a cabeça.
Por quê?
Porque o mundo está ficando a cada dia mais complexo e complicado.
Em Suma
O almanaque.digital pretende nos ajudar a usar melhor a cabeça.
Provamos isso quando somos mais críticos, criativos e sistêmicos. Não apenas em nossos negócios, organizações e times, mas em todas as situações do dia a dia.
Notas
- Citado em Systems Thinkers, de Magnus Ramage e Karen Shipp (Springer, 2009).
- Infobesidade: Neologismo muito criativo para nomear a sobrecarga de informações que caracteriza esses tempos difíceis.
- Porque foi assim que aprendi com um cara fantástico, Sir Ken Robinson, em Libertando o Poder Criativo (HSM, 2011).
- Neste almanaque vou tratar como Sistêmico um corpo de conhecimentos que inclui Cibernética, Teoria da Complexidade, Teoria Geral dos Sistemas, Dinâmica de Sistemas, Pensamento Complexo etc. Oportunamente tentarei explicar essa bagunça.
- Como Escrever Bem (Três Estrelas, 2017). Se sigo escrevendo mal não é por culpa do Zinsser, ok?
- Foto de Gaelle Marcel no Unsplash.