Autor: Jurgen Appelo, holandês que se apresenta como escritor, palestrante, instrutor, desenvolvedor, empreendedor, gerente, blogueiro, leitor, sonhador, líder e pensador livre. Figura relativamente nova na Comunidade Ágil. Este é seu primeiro livro.

Editora: Addison-Wesley (2011).

Promessa do Subtítulo: Liderando Desenvolvedores Ágeis, Desenvolvendo Líderes Ágeis

Do que se trata: GERENCIAMENTO. O autor dirige o livro para gerentes “de linha” (de áreas de Desenvolvimento ou Departamentos de TI) reforçando que não se trata de (mais) um livro sobre Gerenciamento de Projetos. Também “filtra” um pouco mais a seleção colocando que o livro é sobre Gerenciamento Ágil. Mas parece que todo mundo que já teve o prazer de conhecer esta obra descobriu que se trata de um trabalho sobre Gerenciamento no século XXI, o século da Complexidade. GERENCIAMENTO em seu sentido mais amplo.

Três ponto zero?: O gerenciamento 1.0 foi aquele chamado de científico, caracterizado por hierarquias e originado no início do século passado. O gerenciamento 2.0 brota em meados dos anos 1980 e é caracterizado pelas manias e modismos, por patches e add-ons (TQM, BPR, TOC, BsC, Six Sigma etc) que tentavam “corrigir” a versão anterior.

Então veio a teoria da complexidade e sua aplicação na matemática, biologia, economia e sociologia. Aí chega o Jurgen, mergulha na teoria e em sua aplicação nos mais diversos domínios, e a destila em um modelo que ele chamou de Management 3.0.

Indicado para: Gerentes, líderes, desenvolvedores, empreendedores, sonhadores, pensadores livres e todos que queiram entender a razão de tudo neste mundo parecer um tanto complicado e/ou complexo e porque todo sucesso não passa de um adiamento do fracasso.

Contra-indicações: Puristas, extremistas, conservadores, preconceituosos, adoradores de ângulos retos e eleitores do Jair Bosonaro podem sentir um certo desconforto em diversos trechos do livro.

Breve Resenha: Quem lê livros técnicos sobre um mesmo tema com uma certa frequência vive com a sensação de déjà-vu. Nos últimos tempos engoli, total ou parcialmente, mais de uma dúzia de livros sobre o Desenvolvimento Ágil de Sistemas. Poucos realmente colocaram assunto novo na mesa. Dois deles mereceram entrada nesta biblioteca. O resto girou em torno dos mesmos temas, problemas e sugestões. Às vezes mudando nomes, outras tantas reciclando histórias.

Jurgen Appelo acaba de colocar o assunto “Agile” em outro patamar.

Não se trata de um reset, pelo contrário. Jurgen conhece e respeita toda a história que no próximo dia 13 de fevereiro completará dez anos (data da publicação do Manifesto Ágil). Mas ele se apresenta como um pensador livre. E é. Por isso busca coisas com milhares ou milhões de anos de idade ou situações bobas do cotidiano para ilustrar suas colocações e tornar mais palatáveis as ideias e teorias que sustentam seu modelo. Estratégia mais que necessária, porque Jurgen parte de um Corpo de Conhecimentos de Sistemas formado por coisinhas espinhosas como: Teoria Geral dos Sistemas, Cibernética, Teoria dos Sistemas Dinâmicos, Teoria dos Jogos, Teoria do Caos e Teoria da Evolução. Não se assuste ainda. Esta é apenas parte da história que ele conta para justificar o uso do Pensamento da Complexidade (ou Teoria da Complexidade ou ‘simplesmente’ Complexidade, hehe) como base para o seu modelo.

Perdão, não há motivos para sustos. Jurgen apresenta essas teorias e conceitos para “humanos normais” como você e eu. Primeiro em um único capítulo, o terceiro, pavimentando o caminho que seguiremos. Depois em capítulos que concentram toda a parte teórica de cada Visão proposta no modelo Management 3.0. Cada uma das seis visões da Martie (o monstrinho que Jurgen desenhou para representar o modelo) é apresentada em dois capítulos, um teórico e outro prático. Essa sacada, além de facilitar a compreensão de suas sugestões, permite o planejamento de nossos estudos. Este é um livro para ser estudado, não simplesmente lido. Optei por estudar um visão por dia: o capítulo teórico na parte da manhã, o prático bem depois do almoço.

Hora de apresentar, afinal, os seis “olhos” da simpática Martie:

  • Energizar Pessoas: “Penso que as pessoas são as partes mais importantes de uma organização e que os gerentes devem fazer de tudo para mantê-las ativas, criativas e motivadas.”
  • Fortalecer¹ Times: “Acredito que os times podem se auto-organizar, e isto requer delegação de poderes, autorização e confiança por parte dos gerentes.”
  • Alinhar Restrições: “Expliquei que a auto-organização pode resultar em qualquer coisa, portanto é necessário proteger as pessoas e os recursos compartilhados e dar para as pessoas propósitos claros e objetivos definidos.”
  • Desenvolver Competência: “Também acredito que os times não podem atingir esses objetivos se seus integrantes não forem capazes, e que os gerentes devem contribuir para o desenvolvimento da competência de cada um deles.”
  • Desenvolver² Estrutura: “Muitos times trabalham no contexto de uma organização complexa, por isso estou convencido de que é importante considerar as estruturas para melhorar a comunicação.”
  • Melhorar Tudo: “Também penso que as pessoas, times e organizações devem continuamente melhorar tudo de forma a adiar o fracasso o máximo possível.”
  • “Finalmente, acho que a apresentação acima está bem fácil de entender, o que significa que ela provavelmente está errada.”

O resumo acima é apresentado lá no finalzinho do livro, quando o autor confessa: “Sim, meu modelo está ‘errado'”. “Todos Estão Errados, mas alguns são úteis” é o título do capítulo 16. O humor e a honestidade de Jurgen, além, claro, do tanto que ele conhece e estudou, fazem deste livro um marco. Suecos (e seus 1.217 mosquitos), belgas, cubanos e eleitores do Bosonaro terão alguns motivos para reclamar do livro. Acho que nenhum relacionado ao que ele ensina sobre GERENCIAMENTO.

Alguns Trechos Selecionados, Surrupiados e Livremente Traduzidos:

“Acho que o Movimento Ágil negligenciou a importância dos gerentes (de linha). Se os gerentes não sabem o que fazer nem o que esperar de uma organização Ágil, como esperar que eles se envolvam na transição para o desenvolvimento Ágil de software? Qual é a mensagem do Movimento Ágil aqui? Se for apenas ‘não precisamos de gerentes’, então não causa espanto saber que transições para o Ágil estão sendo obstruídas ao redor do globo.”

“Lembre-se que valores Ágeis não são listas fixas com cinco, sete ou doze itens. Este livro é sobre complexidade, não sobre respostas simples.”

“Nenhum sistema³ que se auto-organiza existe fora de um contexto. E é o contexto que restringe e direciona a organização de um sistema.”

“Gerentes inteligentes sabem que devem tomar o menor número de decisões possível.”

“Acredito que um ‘ponto fraco’ do Manifesto Ágil é o fato dele não reconhecer (explicitamente) que todos os projetos de software precisam de pessoas inteligentes, disciplinadas e atentas. O paradigma ‘pessoas mais que processos’ é jóia, até você descobrir que seu time se limita a dois duendes, um papagaio, uma cabeleireira e um gerente de projetos aparentemente brilhante mas que é cego, surdo e mudo. Não há coaching no mundo que faça este time se auto-organizar e entregar um produto bem sucedido.”

“Disciplina * Habilidade = Competência”

“A melhor maneira de implementar processos Ágeis é fazê-lo do seu jeito.”

“Modelos de maturidade são pouco úteis, talvez até um pouco ofensivos.”

“Se eles podem escovar seus dentes todos os dias para se livrar de cáries, por que não podem escovar o código diariamente para se livrar dos bugs?”

“Gerentes de projetos estão ali para servir os times, não para controlá-los. Gerentes de projetos estão ali para gerenciar projetos, não pessoas.”

“Se você introduzir um novo produto de software em um ambiente, o ambiente vai mudar, consequentemente os requisitos para o produto também mudarão.”

“O valor percebido de uma mudança é proporcional à dor que se sente por não mudar.”

Compañero, no hay camino. Se hace camino al andar.

Observações:

  1. O termo original é “empower”. Optei por “fortalecer” (times) como tradução porque empowerment normalmente é entendido apenas como “delegação de poderes”. O autor tem objetivos mais amplos e ambiciosos para a palavra.
  2. Outro termo comum que ainda me atrapalha é “grow”. Simples: é crescer… ou aumentar, germinar, florescer, produzir. Optei por “desenvolver” por achá-lo mais coerente com a intenção do autor: “grow structure”.
  3. A palavra “sistema” é utilizada no livro em seu sentido mais amplo. Empresas, times, pessoas e bactérias são sistemas.
  4. Esta entrada ficou longa, muito longa! O livro, em cada uma de suas 413 páginas, fez por merecer. De tempos em tempos me deparo com um título que realmente me “melhora”. Muito. Não vejo a hora de estudá-lo de novo.