No último dia 12 de maio o Guia BABoK v3 foi liberado para revisão pública. Dado o tempo de maturação – cinco anos se passaram desde a última atualização – a expectativa era a de um grande salto qualitativo. Ao contrário do que ocorreu entre as versões 1.6 e 2.0, a evolução é bastante perceptível. Infelizmente, há alguns poréns.

Comecemos pelas boas novas. As definições básicas foram todas revistas. A verborragia que tanto atrapalhava e comprometia o entendimento do guia foi, em grande parte, eliminada. Tomemos como exemplo a própria definição da Análise de Negócios: ela foi abreviada de 43 para 27 palavras. Sai aquele papo sobre “…atividades e técnicas para servir como ligação entre parte interessadas…” – um terror, e entra “viabilizar mudanças em organizações através da definição de necessidades e recomendação de soluções”. Boa!

A nova versão também troca a definição de Requisito proposta pelo IEEE por uma bem mais enxuta: “representação utilizável de uma necessidade”. Enxuta e curiosa. Porque prevalece um entendimento técnico em detrimento da definição fixada em dicionários. Requirement, segundo o Oxford, é uma “coisa necessária ou desejada”. Aqui no Brasil tomamos a liberdade de traduzir Requirement como Requisito, termo que o Houaiss define como uma “condição para alcançar determinado fim”. A Navalha de Occam adaptada para analistas de negócios ensina que, na dúvida (entre definições de um mesmo termo), deve prevalecer o que facilita a vida de uma pessoa de negócios, não a do técnico. Por isso termos como “requisitos não funcionais” deveriam ser abolidos ou apresentados com ressalvas e as devidas adaptações para leigos. Infelizmente, isso não ocorreu.

E não se trata de um mero detalhe. Se uma das maiores contribuições de um analista de negócios é a comunicação eficiente e eficaz, o primeiro passo é a adoção de um vocabulário livre do tecniquês e de jargões. Noves fora, o fato é que a simplificação apresentada na nova versão merece aplausos.

Escorando a Estrutura

A estrutura básica, com seis disciplinas (KA – Knowledge Areas) e um “repositório universal” (Competências Fundamentais) está mantida. Alguns nomes sofreram alterações, como Análise Estratégica ao invés de Análise Corporativa. Pequenas alterações que não são apenas cosméticas porque facilitam o entendimento¹.

Uma das novidades na estrutura do BABoK é o BACCM (Business Analysis Core Concept Model – Modelo de Conceitos Centrais). O modelo é formado por seis termos apresentados na seguinte ordem: Mudança, Solução, Contexto, Valor, Partes Interessadas e Necessidades. Uma mudança em um desses “lugares” forçaria uma revisão nas outras cinco “dimensões”. E isso facilitaria uma visão holística.

Honestamente, não entendi bem a novidade. E o checklist que a encerra dá certo frio na espinha – irão os decorebas adotá-lo, para pesadelo das partes interessadas em busca de soluções para problemas que em dado contexto mutante devem gerar algum valor? Não sei se é a santa obviedade que me trai. Ou meus pré-conceitos. De qualquer forma, melhor esperar por experiências ou outras explicações.

Como comentei anteriormente, o BABoK agora apresenta uma nova seção chamada Perspectivas. Estão ali: Agile, BI (Business Intelligence), TI (Tecnologia da Informação), Arquitetura de Negócios e BPM (Business Process Management). O que delimita esse conjunto além do óbvio berço tecnológico? Nada!

Mas o BABoK ensina que as Perspectivas determinariam conjuntos específicos de comportamentos, termos e atitudes. E justificariam definições diferentes para: Escopo de Mudanças; Escopo da Análise de Negócios; Impacto em KA’s; Metodologias e Técnicas; e Competências Fundamentais. Como as Perspectivas não são mutuamente exclusivas, fica a curiosidade em saber como ficaria o caldo no caso de um projeto de BI e de TI guiado por algum método Agile.

Lembrando seus velhos (e maus) momentos, o BABoK oferece um desserviço neste ponto. Que é um tanto comprometedor por falar tanto de tecnologia e muito pouco sobre Negócios. É desta forma que o discurso sobre uma Análise de Negócios ampla, geral e irrestrita (e não mais subordinada a TI) soa falso e cai por terra.

A estrutura original do BABoK, apesar de suas carências, não precisava dessa escora. Precisava, isso sim, rever a maneira como trata a modelagem de negócios. Salpicar o “Pensamento Visual” como uma nova Competência Fundamental ou “Arquitetura de Negócios” como uma Perspectiva é muito, muito pouco.

O Salto que Falta

Acho que ninguém duvidava que a nova versão do BABoK seria consideravelmente melhor que a anterior. Assim como a próxima também será uma evolução. Mas quanto tempo esperaremos por ela? Outros cinco ou seis anos? E a comunidade, como agora, terá generosos dois meses para uma “revisão pública”?

Talvez tenha chegado o momento de discutir uma questão que é maior do que todas listadas acima. Por que o BABoK não vira um Wiki? Por que, a exemplo da Wikipedia, ele não aceita contribuições de todos o tempo todo?

Não acredito em impedimentos financeiros. Vendas do guia não representam nem 10% das receitas do IIBA². E uma versão Wiki não significaria, necessariamente, o fechamento desta fonte de receitas.

Outro fator que deve tornar este momento único – uma janela de oportunidade – é a entrada do PMI no mercado de análise de negócios. Um corpo de conhecimentos de fato aberto e democrático seria uma resposta e tanto. Esperta, no bom sentido, ao reconhecer que sempre haverá mais inteligência fora do que dentro do comitê que elabora o BABoK, por capacitado que ele seja. Seria, acima de tudo, uma resposta catalisadora, que tornaria a comunidade de análise de negócios mais próxima e atuante. O que impede esse salto?

Notas

  1. O que não significa que não haverá confusão em outros contextos. Mais sobre isso em um futuro artigo.
  2. Em dados de 2012. O relatório financeiro do IIBA é aberto.
  3. How to Break In a New Book é uma foto-dica de Jocelyn McAuley.