Retomando o papo sobre Arquitetura de Negócios e a arte de domar o monstro do tempo. A primeira parte, resumida aqui, tratou da construção de uma estrutura resiliente. Este artigo inaugura a segunda parte. O tema central é Planejamento. Colocadas as peças no tabuleiro, é hora de debater como uma empresa pode projetar seu desenvolvimento¹. Apertem os cintos. E usem o assento para flutuar.

Antes de conseguir dizer para onde vai, uma organização precisa saber onde está. Essa é a intenção do primeiro passo – Formular a Bagunça². É um grande trabalho de Análise de Sistemas. Aliás, um trabalho que realmente merece o nome Análise de Sistemas.

A empresa precisa entender sua situação atual e de seu ambiente. Uma combinação de poucas ferramentas pode ser suficiente. Um fluxograma em alto nível ilustra a forma como a empresa cria e distribui riqueza. O Business Model Canvas ou o Tabuleiro Sistemático são alternativas ou complementos ao fluxograma. Por fim, análises SWOT e PESTEL devem completar a fotografia do presente.

Aí vem uma pergunta chave: Quais são as sementes da autodestruição da empresa? Dramático, não?

É papo sério: quais são os comportamentos e fatores que, se mantidos, levarão a organização para a morte certa? Entramos aqui em um trabalho de projeção de cenários. Um trabalho que requer honestidade e desapego.

Repare: estamos pegando a empresa como é (as is) e colocando-a em um futuro plausível. Determinados fatores e comportamentos, se mantidos como são, devem tornar a organização inviável. Quais são eles?

Se a indústria automobilística seguisse priorizando verdadeiros beberrões de combustível…
Se aquela telecom seguisse vendendo sem cuidar dos serviços de suporte…
Se a MS não olhasse para a nuvem e sistemas abertos com outros olhos…
Se os bancos não inventassem o dinheiro de plástico…
Se a gente não aprender a consumir água…
Se não chover…

Existem diversas ferramentas para a elaboração de cenários. Duas das mais eficazes que conheço são o Diagrama de Efeitos (Causal Loop Diagram) e o Diagrama Estoque-Fluxo. Ambas têm origem no Pensamento Sistêmico. Ou seja, elas encorajam e forçam uma visão holística – contemplamos TODA a bagunça.

Duvide muito da firma que concluir que não precisa mudar nada. Ela já bateu as botas e esqueceu de deitar.

Aliás, destacar esse tipo de negação ou obstrução é a última etapa da formulação da bagunça. Além das internas, também precisamos inventariar restrições externas. O que pode entrar no caminho das necessárias mudanças?

Em nossa cultura, esse tipo de trabalho só costuma acontecer quando uma crise dá as caras. Nervos à flor da pele e decisões mal pensadas caracterizam os momentos de “deus nos acuda”. A crise se aprofunda, né Geraldo?

Ao Formular a Bagunça estamos antecipando crises. Estamos “criando a oportunidade de controlar ou influenciar uma parte significativa do futuro da empresa”³ e de seu ambiente. Isso é sabedoria. O resto é improviso, jeitinho, desespero, dedos apontados e assentos que flutuam.

O Plano do Papo sobre Planos

Esta segunda parte da série exige um pouco mais de planejamento. Além deste, teremos mais quatro ou cinco artigos sobre o processo de planejamento. Na sequência será apresentada uma ferramenta (“o segredo mais bem guardado do mundo dos negócios”) e um exemplo.

Ao contrário da parte anterior, agora é possível que você acompanhe a série elaborando seus próprios exemplos. As ferramentas sugeridas são conhecidas e de rápida assimilação. E você pode utilizar uma empresa, departamento ou time como base para os exercícios. Se quiser compartilhá-los comigo, fique à vontade. Aprenderemos juntos.

Para quem topar o exercício, algumas dicas:

  1. Guarde tudo que desenvolver, especialmente a fotografia da Bagunça. Ela servirá como um poderoso checklist;
  2. Também deixe anotadas todas as Premissas e Suposições sobre o futuro projetado. Elas são parte essencial da ferramenta que será apresentada ao fim da série;
  3. O processo de planejamento utilizado é Interativo e Iterativo. Portanto, não se preocupe em ser exato ou perfeito – você não conseguirá mesmo. E a todo momento você poderá rever qualquer um dos seis passos;
  4. Por fim, mas não menos importante: limpe a cuca.

Farei de tudo para encerrar este workshop virtual ainda em 2014. Porque em 2015 muita coisa vai mudar. Inté!

Notas

  1. A obsessão nacional (segundo uma parte da mídia) é com Crescimento. Russell Ackoff nos ensina a não confundir crescimento (que ele relaciona com earn, ganhar) com desenvolvimento (learn, aprender). A gente anda precisando mais do segundo, não acha?
  2. O termo “Formulando a Bagunça” tem a minha cara. Mas também é do Ackoff. Tradução de “Formulating the Mess”. Seu método de planejamento é apresentado de forma detalhada em dois trabalhos: Idealized Design (FT Press, 2006) e Re-Creating the Corporation: A Design of Organizations for the 21st Century (Oxford University Press, 1999). Tomei a liberdade de combinar seu método com outras ideias e ferramentas.
  3. Frase surrupiada do segundo título acima.
  4. Imagem surrupiada de Jef Safi. Título original:sεrεndıpıtıng dıffεrAncε catabolısm . . Tudo a ver!