Hoje em dia sabemos o preço de tudo e o valor de nada“. Esta frase famosa é atribuída a Oscar Wilde, escritor irlandês que viveu entre 1854 e 1900. Em outro mundo, outros tempos. Mas a frase, com milhares de aparições no Google, parece atual. Seja como álibi, desculpa ou provocação. Se você é um trabalhador do conhecimento – se faz do que carrega na cuca uma profissão – permita-se um minuto de reflexão sobre ela. Como você define seu preço – seja ele um salário ou honorário por serviços prestados? Ele define de fato o valor que você acredita representar/entregar? Ou apenas se acomoda em uma faixa definida pelo mercado?

O tema parece cercado de um certo tabu. Fui puxado para ele depois de assistir a um vídeo de um famoso “guru” da tecnologia tupiniquim¹. Ele iniciou a conversa dizendo que esse negócio de cobrar por hora não faz mais sentido. Não na Economia do Conhecimento. Certo! O problema é que no resto do papo (um número de palavras que começa pela mesma letra) não tocou mais no assunto. E aí, se não por horas, vou cobrar como?

Nunca gostei da unidade “homem/hora” ou “hora técnica” (sic) porque ela é furada como um queijo suíço. Serve para trabalhos braçais e repetitivos. Mas não tem nada a ver com o trabalho criativo ou do conhecimento. Por dois motivos principais:

  • Uma excelente ideia de solução pode aparecer em uma fração de segundos. Ela vale uma fração de seu valor-hora?
  • Todo esforço caminha no sentido daquilo que está sendo medido“. Esta frase de Tom DeMarco deveria ser chamada de lei. Se o cliente ou empregador mede (pede) horas, horas ele vai receber. Porque corpo presente não é evidência de mente presente.

Mas o que fazer se, apesar de todos os argumentos, o mercado ainda compra (e vende) horas? Eu insisto – teimo mesmo – em cobrar por serviço. Foram raras as vezes em que um cliente topou. O que me obriga a sempre ter na manga um taxímetro. Conta fácil, que só exige uma estimativa um pouquinho mais pensada sobre uma das seis dimensões que me ajudam a formar o preço de determinado serviço. Mostrarei abaixo o esquema que muito me ajuda. Na expectativa que ele lhe seja útil também, seja na hora de negociar um salário ou o valor de seus serviços.

Preço é Estratégia

Com certeza não é sua única arma estratégica, mas o preço sintetiza toda a sua estratégia. Como já escreveu Gerald Weinberg², “a determinação de preços tem muitas funções e a permuta de dinheiro é apenas uma delas“.  Através do preço você:

  • Define seu mercado;
  • Se diferencia da concorrência;
  • Atrai (ou repele) determinados clientes (ou empregadores); e
  • Delimita seus custos.

Pense nisso: de certa maneira, seu preço diz quem você é! Por isso é tão importante dedicar um tempinho toda vez que um preço precisa ser definido.

O ponto de partida não tem mistério nenhum. Você precisa de uma estimativa de custos e de uma margem de lucro. Ou de um valor médio de mercado. Você escolhe se ele representará um preço mensal, o valor total de um serviço ou a fatídica “hora técnica”. Este será seu preço base, aquele que aparece no centro do diagrama ao lado.

O diagrama exibe as dimensões ou fatores de ponderação que mais considero quando vou precificar um serviço. São seis dimensões de três tipos diferentes. Perfil do Freguês e Duração e Frequência podem funcionar como inflacionadores ou redutores do preço (+/-). A primeira indica apenas o quão atraente ou repugnante é aquele cliente. Ele é um mala ou um amor de pessoa? O histórico (vivido ou pesquisado) do cliente o fará aumentar ou reduzir o preço final.

A dimensão Duração o ajudará a contrabalancear os efeitos do perfil do freguês. Por exemplo: o cliente é muito chato, mas é um trabalho de curtíssima duração. Ou seja, “dá para aguentar sem a necessidade de furar seus olhos“.

Mas esta dimensão tem seu peso próprio. Até que ponto é desejável que aquele serviço ocupe sua agenda por um longo período? É a sua necessidade de uma certa estabilidade que o fará utilizar esta dimensão como um fator de inflação ou deflação de seu preço.

As duas dimensões do lado direito do diagrama, Criticidade e Complexidade, funcionam apenas como itens inflacionários. A Criticidade indica o quão valioso (e provavelmente urgente) é aquele serviço para o cliente. Quase sempre há uma relação direta entre valor, urgência e… Risco! Por isso esta dimensão representa acréscimos ao preço base.

Assim como a Complexidade, uma dimensão que lhe permite avaliar o quanto de seu cérebro será exigido na realização daquele trabalho. Não faz sentido, por exemplo, que você tenha um mesmo preço quando ministra um treinamento corriqueiro e quando faz uma consultoria daquelas bem cabeludas. Se lhe falta uma mínima noção sobre o tamanho da encrenca, aumente o fator complexidade. Se o cliente não consegue explicar a própria dor, idem. Normalmente isso é sintoma de um problema maior em estado de espera por uma luz – a sua luz!

As duas últimas dimensões funcionam como lembretes de que alguns fatores podem justificar uma redução do preço. A Oportunidade de Aprendizado é contraponto da complexidade. Acontece mais ou menos assim: “ok, o trampo é deveras difícil. Por outro lado, tenho a oportunidade de aprender a lidar com a tecnologia X e com o método Y”. Pronto, já tens uma boa desculpa para, antes mesmo de o cliente pedir, ceder um generoso desconto. Faz bem para a relação que o cliente seja comunicado de suas intenções (de aprendizado). Weinberg² de novo: “o preço não é uma coisa; é um relacionamento negociado.

Por fim temos o Posicionamento, a contribuição daquele cliente ou serviço para sua colocação no mercado. Se prestar serviços para determinada organização enriquecerá seu currículo ou portfólio, talvez você ache justo cobrar um pouco menos. Se a execução de um dado serviço o ajudará a se diferenciar, talvez ele valha o investimento – e é assim que você veria o desconto concedido, como um investimento.

Matemática

O modelo “matemático” acima tem muito pouco de matemática. Sua aplicação depende, como vimos, de alguma intuição e muito tato. Depende também de boas informações sobre o cliente (ou empregador) e sobre o serviço a ser executado. Como foi colocado, as dimensões devem ser vistas como lembretes. E é claro que eu espero que você tenha os seus.

Ao ponderar o que tem valor para você, o preço aparece naturalmente. Se é verdade que hoje ninguém sabe o valor de nada, prove através do preço que o seu valor você conhece bem. E que sua dolorosa é justa.

 

Notas

  1. Outra coisa que invejo em Gerald Weinberg, além da qualidade de seus escritos e de sua imensa produtividade, é sua não parcimônia ao detonar trabalhos alheios. Nada de jogo sujo ou briga de egos ou por espaço. Em seus livros ele cita artigos que não gostou, dá nome aos bois, mostra o que não gostou e apresenta seu lado. Sei lá o motivo, mas aqui em Pindorama a gente vive pisando em cascas de ovo. Apesar de alguns bois implorarem para ter seus nomes berrados.
  2. Trechos surrupiados de um livro que, caso dependesse do título, não mereceria a leitura. Estou falando de “Consultoria – O Segredo do Sucesso”, trabalho do Weinberg publicado pela McGraw-Hill em 1990. O título original era apenas The Secrets of Consulting. Mas as editoras tupiniquins morrem de inveja das distribuidoras que traduzem nomes de filmes.
  3. A imagem que ilustra este artigo é do sr. mzocoxito.